Ideia é ampliar o trabalho da Secretaria de Ação Social e Cidadania e mudar a visão para o ser humano como um todo
A Secretaria de Ação Social e Cidadania da Prefeitura de Salto lançou no dia 20 de abril, oficialmente, o Departamento de Direitos Humanos e Cidadania, estrutura que funcionará dentro da pasta e que pretende mudar a visão segmentada dos conselhos para uma visão do ser humano como um todo e apresentar aos cidadãos quais são os seus direitos garantidos na Constituição Federal de 88.
Salto é a primeira cidade da Região Metropolitana de Sorocaba e a 13ª do Estado a contar com uma estrutura voltada para esse fim. A secretária Mércia Falcini diz que a criação do departamento foi um ato de coragem do prefeito Laerte Sonsin Júnior (PL), que encampou o projeto dela e a da diretora do departamento Cecília da Rocha. “Digo coragem, porque ainda é um preconceito na sociedade. Quando falamos de direitos, muitos acham que vamos defender bandido e não é isso o que o departamento fará”, disse ela.
A diretora do departamento afirma que já existem de antemão vários projetos preparados para serem lançados. Segundo ela, em maio haverá a campanha “Faça Bonito”, em junho o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil e em julho a Semana da Diversidade e lançarão nessa semana um Conselho Municipal da Diversidade. A Cidadania se juntará ao Esporte e à Defesa Social nesses projetos.
Vejam abaixo a entrevista que a secretaria e a diretora concederam ao PRIMEIRAFEIRA.
Por que criar um departamento específico para tratar de direitos humanos e cidadanias?
Mércia Falcini: Primeiro temos que dizer que o departamento está dentro da Secretaria de Ação Social e Cidadania. Quando pensamos em uma Reforma Administrativa no Poder Executivo do munícipio, cada secretaria pensou o seu modelo ideal de trabalho. Nós pensamos e consultamos várias diretrizes do Sistema Único de Assistência Social (Suas) para seguirmos os melhores parâmetros e direções. Então fizemos a nossa reforma sempre olhando para a política unificada e o departamento nasceu primeiro dessa ideia. Depois nós já tínhamos dentro da secretaria, mas não dentro de um departamento, o trabalho com os direitos humanos. Inclusive, a Cecília da Rocha, que é a gestora desse trabalho, já exercia uma função de gestão de trabalho dos direitos humanos. Só não tínhamos a regulamentação desse departamento. Agora ele está estruturado e fazemos um link com uma nova tendência de olhar para essas questões dos direitos de uma forma mais sistêmica. Há algum tempo tínhamos as coordenadorias da mulher e da pessoa com deficiência, mas era um trabalho muito isolado e a tendência hoje de concepção humanista é olhar o ser humano como um todo.
Se é assim, por que a criação desse departamento só ocorreu agora no terceiro do mandato da atual gestão?
Mércia Falcini: O departamento foi criado só agora porque, para que ele existisse, precisávamos da Reforma Administrativa, que passou pela Câmara recentemente e ainda tem todo um processo legal para isso acontecer. Por exemplo, temos de criar cargos. Criamos o cargo da Cecília, que é a diretora desse departamento e junto a esse cargo também tem os outros funcionários que vão chegar para que se tenha cada vez mais autonomia e força.
No total, o novo departamento terá quantos funcionários?
Mércia Falcini: Estamos criando agora, porque veio agora na revisão da reforma. Sabíamos que teria esse departamento, então criamos primeiro o cargo da diretora e temos um assistente administrativo. Estamos criando agora mais dois cargos: um sociólogo e provavelmente um pedagogo. Ainda estamos discutindo, mas queremos que entrem mais duas pessoas junto com a Cecilia, na liderança, para poder trabalhar olhando a essência desse departamento. Depois teremos os auxiliares que aí não temos limite, que são os administrativos que auxiliam no trabalho burocrático. Mas a ideia é ter um diretor e dois profissionais multidisciplinares.
Cecília da Rocha: É importante destacarmos neste momento que, através da reforma, a Prefeitura conseguiu garantir que esse departamento fosse ocupado por servidores públicos concursados. Não será um cargo em comissão. É algo de carreira mesmo. Já estou nesse trabalho da Prefeitura há dez anos.
Qual trabalho será feito por esse departamento segundo a sua visão de diretora?
Cecilia da Rocha: É importante destacar que direito não é uma ajuda. É algo garantido por lei. O departamento vai olhar para as pessoas como uma pessoa única, que pode ser uma mulher, pessoa com deficiência ou não, preta, idosa ou jovem, não importa. É uma pessoa só e a palavra pessoa sempre vem antes das demais. É esse olhar que é importante que o departamento tenha. A nossa função de imediato é formular, executar e analisar as políticas públicas sociais de direito para todas as pessoas. Já trabalhamos há um bom tempo com a política da mulher, da juventude, da criança e do adolescente, do idoso, da pessoa com deficiência e da questão racial através do conselho da igualdade racial. Sempre buscamos muito os indicadores, agora mesmo teremos uma ação do departamento, que vai trazer a questão da isenção tarifária para pessoas com deficiências e pessoas que estão em tratamento de câncer. Essa isenção vem do governo estadual e, através dela, credenciaremos todas as Unidades Básicas de Saúde (UBS) e teremos o acesso de entender onde estão essas pessoas com deficiência. Por exemplo, em quais UBSs têm mais atendimento com pessoas com deficiência visual, cadeirantes, ente outros. A partir do momento em que conseguirmos esses projetos, seja do governo federal, estadual ou inclusive municipal, teremos esses indicadores. É uma função nossa mapear tudo isso para aplicar as políticas públicas no município.
Esse departamento vai tratar da acessibilidade especificamente?
Cecília da Rocha: Acho que é fundamental termos esse departamento, pois temos uma cidade “antiga” construída sem acessibilidade. Por exemplo, eu defendo muito a questão de que acessibilidade não é apenas arquitetônica, mas o idoso usa a acessibilidade arquitetônica, a gestante, uma criança que está começando a andar, então todos temos que pensar em uma cidade mais acessível. Mas também temos de pensar em uma acessibilidade comunicacional. Uma das ações, que já foram feitas no começo da gestão Laerte Sonsin Júnior, foi a implantação do sistema de libras através de um aplicativo, que, aqui na nossa região, somente nós e Indaiatuba saímos na frente com isso. Com ele, qualquer turista que esteja aqui, vindo de qualquer região, consegue baixar esse aplicativo gratuitamente e tem um intérprete de libras 24 horas e 7 dias por semana, inclusive pode ser utilizado em redes particulares. É uma questão inovadora.
Mércia Falcini: É importante frisar que é um trabalho que é da essência da nossa secretaria. Sempre trabalhamos com essas questões de proteção dos direitos e no cuidado com a violação, pois temos as unidades responsáveis por isso. Mas a coragem de criar um Departamento dos Direitos Humanos vai um pouco além e digo coragem, porque ainda é um preconceito na sociedade. Quando falamos de direitos humanos, muitas pessoas falam “ah, vai defender bandido”. Então temos que ter coragem primeiro para combater e mostrar que não significa isso. Os direitos já existem desde a nossa Constituição de 1988, que rompeu com um Brasil de privilégios para poucos. Mas eles não conseguem ganhar espaço e serem praticados sem que haja leis de proteção e garantia. Então o departamento vem para isso, para garantir que a Constituição de fato conduza a nossa cidade. Se hoje ainda é necessário esse departamento é porque não cumprimos com o nosso dever de uma sociedade justa e humanizada. Se ainda existe o esquecido é porque ainda temos muito o que fazer e para fazer direito precisamos de um departamento que olhe essas questões. Não é somente dar continuidade ao que já fazíamos, mas criar uma gestão financeira para dar mais investimento para essas questões. O ministro Silvio (Luiz de Almeida, dos Direitos Humanos e da Cidadania) fez um discurso lindo na posse dele e disse uma frase que eu gosto sempre de repetir: “Todos os seres humanos são valiosos”. Então, todos os seres humanos: o negro, a mulher, o indígena, a pessoa com deficiência, todos os seres humanos que compõem a sociedade brasileira existem e são valiosos. Faltava esse departamento para garantir uma política efetiva de inclusão.
Quantas cidades na região tem um departamento como esse?
Mércia Falcini: Na Região Metropolitana de Sorocaba, à qual nós pertencemos, nenhuma cidade tem Departamento de Direitos Humanos no Poder Executivo. No Estado todo nós somos a 13ª cidade a ter. É algo a se comemorar de uma gestão como a do prefeito Laerte que teve coragem e saiu a frente.
Quais campanhas o departamento já tem planejado para realizar?
Cecília da Rocha: De antemão já podemos dizer que agora em maio teremos a campanha “Faça Bonito”, em junho teremos o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PET) e em julho teremos a Semana da Diversidade e lançaremos nessa semana um Conselho Municipal da Diversidade. No PET, faremos palestras e rodas de conversa com empresas, com associações, como a Associação Comercial, Industrial e Agrícola de Salto (Acias); pequenos comerciantes e empresas familiares para conversar sobre isso, de modo que eles também nos ajudem. Além disso, temos muitas opções de trabalho para menores de idade, como o de menor aprendiz, para que não contratem esses jovens sem esse contrato que assegura os seus direitos. Uma campanha que exemplifica nosso trabalho é a campanha “Faça Bonito”, que é sobre a prevenção e combate à violação dos direitos das crianças em relação à exploração sexual. A campanha sempre foi conduzida pelo Conselho da Criança e do Adolescente, mas como lançamos o departamento antes da campanha, ela veio para nós e percebi nas conversas com diretoras das escolas e organizações que criamos um respeito maior para levar a campanha que ficava restrita aos nossos espaços, como os Centro de Referência de Assistência Social (Cras). Agora ela vai também para as escolas particulares, municipais e estaduais. Vamos para a rua fazer um buzinaço. Faremos um passeio ciclístico. O departamento conseguiu envolver não somente a Secretaria de Ação Social, mas a de Esportes e Defesa Social. Então conseguimos unir mais forças.
A questão recente da violência nas escolas contribuiu para a criação desse departamento?
Mércia Falcini: Na verdade não, até porque o departamento já estava criado desde que a reforma foi aprovada. Nós só fizemos o lançamento agora. Tivemos um tempo para estruturar melhor e organizar os recursos para esse ano. A questão da violência nas escolas veio ao mesmo tempo, mas foi uma boa hora para lançarmos o departamento, pois olhamos também para essa questão, que envolve a internet, o bullying e a tecnologia. Temos ações com a Secretaria de Educação para olhar para a questão do bullying e campanha nas escolas que vamos reforçar agora.
Qual a principal meta do departamento para este ano?
Cecília da Rocha: A ideia principal do departamento é defender o ser humano, mostrar para as pessoas os seus direitos e fazer com que elas sejam protegidas com esses direitos. Sentimos que o ser humano está muito distante da sua essência, do amor ao próximo e da empatia de se colocar no lugar do outro. É um trabalho que não vai acabar tão cedo, então precisamos ter o departamento para que as pessoas saibam que aqui elas podem saber o que podem ou não fazer, quais seus direitos e quais são os deveres.
Mércia Falcini: Podemos separar em dois pilares a função do Departamento dos Direitos Humanos: primeiro a proteção e garantia dos direitos e segundo as campanhas socioeducativas, visando uma sociedade mais igualitária e justa de inclusão para todos.
Vocês recebem muitas denúncias?
Mércia Falcini: Recebemos sim. Recentemente tivemos um caso de bullying dentro da escola contra uma menina transexual. Então fomos lá dar apoio, fizemos reuniões e levamos psicólogo.
Cecilia da Rocha: Acolhemos a denúncia. Se uma pessoa ligar aqui na secretaria para falar conosco, acolhemos essa suspeita de denúncia, que será averiguada e faremos os encaminhamentos necessários, seja para os Cras, para o Ministério Público ou para a Delegacia de Polícia. Hoje temos uma parceria muito grande com o Poder Judiciário. Trocamos muitas informações para podermos auxiliar essas famílias e efetivamente garantir que todos consigam se manter dentro dos seus direitos e deveres. É importante destacar que não temos o poder de polícia. Agimos conforme a legislação para levarmos o direito às pessoas. Não vamos em uma casa, por exemplo, de um homem que é violento com a sua esposa, para tomarmos uma atitude. Nosso trabalho vem antes disso. É ensinar os pais a educarem seus filhos para não serem machistas e violentos e trabalhar com essas crianças para respeitarem as diferenças das pessoas. Tudo isto é uma prevenção.
Como são os trabalhos realizados com as pessoas em situação de rua? Logo entramos no inverno, quando ele é mais necessário.
Cecilia da Rocha: O departamento dará um super apoio para todas essas ações que já temos na secretaria e tentaremos inovar e fazer um trabalho de autoestima para eles. Quem sabe um trabalho de fotografia para realizarmos uma exposição com as fotos deles para que eles também se sintam parte integrante da nossa comunidade. Além disso, temos que valorizá-los através de cursos de capacitação, para que eles possam voltar para o mercado de trabalho. Muitos, graças à secretaria, saíram da situação de rua e hoje têm sua casa, pagam aluguel, tem trabalho. Para a gente isso é uma vitória sob todos os aspectos com certeza.