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Padre defende que a igreja dialogue mais para entender e se aproximar da sociedade

O padre Elias Pavan, de apenas 30 anos, discursa com desenvoltura sobre a religião que abraçou e sobre os temas polêmicos da Igreja Católica, como a necessidade de modernização para evitar a perda de fiéis e de abertura para se manter atual.

À frente da Paróquia do Jardim Santa Cruz, que completará seis meses de vida no dia 13 de junho, daqui 11 dias, o padre defende que a Igreja Católica dialogue mais para entender e se aproximar da sociedade, porque é desta forma que entende a evangelização.

“Talvez tenhamos uma igreja mais reduzida em número, mas enriquecida em qualidade, em testemunho de vida, num cristianismo que busca viver a fé”, disse o sacerdote sobre o futuro dentro dessa tese de modernização e de abertura para os novos tempos.

Para ele, a nova paróquia tem sido importantíssima para a região, por oferecer apoio espiritual e social. “O fato de criar a paróquia proporciona um cuidado maior com a população na questão espiritual e mais atenção para as obras sociais”, destacou.

Veja abaixo como foi a entrevista ao PRIMEIRAFEIRA.

 

Como o senhor vê o futuro da Igreja Católica no Brasil?

Padre Elias Pavan: É uma igreja que vai cada vez mais aprender a dialogar com outras religiões, com outros setores da sociedade e com outras pessoas que vivem afastadas, como, por exemplo, os homossexuais ou casais de segunda união. Talvez tenhamos uma igreja mais reduzida em número, mas enriquecida em qualidade, em testemunho de vida, num cristianismo que busca viver a fé. Além disso, deveremos ter uma igreja mais engajada com a sociedade na questão espiritual, mas também na parte civil e social, preocupada em ir ao encontro das pessoas, não apenas esperando que venham até a igreja como sempre foi. A igreja tem uma dimensão missionária de anunciar a fé, sobretudo àqueles que não a conhecem.

 

A igreja perdeu cerca de 5% de católicos nos últimos 20 anos no Brasil. A que o senhor atribui essa redução?

Padre Elias Pavan: Penso que há uma série de motivos. Há um problema de conjuntura dentro do cristianismo católico, que são os chamados católicos não praticantes, o que, do ponto de vista da igreja, não existe. Um pouco dessa queda está envolvendo essas pessoas que não têm engajamento, mas têm simpatia pela Igreja Católica, por gostarem do Papa Francisco, ou uma série de outros motivos. Essas pessoas que estão na chamada “periferia da fé”, quando são convidadas a irem a outra igreja, acabam se identificando e ficando. Claro que algumas atitudes de membros da igreja colaboram para o afastamento dessas pessoas.

 

Então, essas situações envolvendo membros da Igreja Católica podem influenciar nessa queda no número de fiéis?

Padre Elias Pavan: Geralmente é coisa externa, envolvendo uma minoria, mas acaba influenciando. Quando era vigário em Jundiaí, um dia estava atravessando a rua vestido de padre e um carro passou na rua. Então o condutor abriu o vidro e gritou: “Pedófilo”. Para muitas pessoas, existe esse estereótipo de que o padre é pedófilo. Sobretudo para aqueles que estão afastados da igreja e não sabem como é nosso trabalho, isto é muito presente. Essas coisas certamente abalam a fé de quem não está inserido.

 

Desde que o Papa Francisco assumiu, a igreja tem mudado alguns conceitos e ficado menos conservadora. Um dos temas é a questão do aborto. Qual a opinião do senhor sobre isso?

Padre Elias Pavan: Nesse sentido eu estou em comunhão com a igreja. Até porque, sendo padre, se eu assumi esse ministério, preciso ensinar o que a igreja ensina e não o que eu acho. Temos uma determinação do próprio Jesus, que diz respeito à preservação da vida, desde a concepção até a morte natural. Essa é uma pauta que a igreja defende e, por mais que haja debates, defendemos a vida. O Papa Francisco abriu essa discussão, mas pode vir quem for, o posicionamento da igreja será o mesmo.

 

E em relação ao homossexualismo, qual o posicionamento?

Padre Elias Pavan: Nesse sentido o Papa Francisco também tem sido muito aberto, porque a igreja sempre defendeu a condenação do pecado e não do pecador. O maior exemplo é o do bom ladrão, que pediu o perdão para Jesus na hora da morte e Jesus concedeu. A igreja trata do pecado. A prática do pecado é algo que se condena. Agora, o pecador sempre será acolhido. Temos de manifestar a misericórdia de Deus. Partindo do ponto de vista da realidade humana, precisamos viver a graça de Deus. A igreja deve acolher o pecador para que possa viver da melhor forma possível. Dentro da igreja, todos são bem-vindos. Só incentivamos para que, não apenas o homossexual, mas qualquer pessoa evite a prática do pecado.

 

Como a igreja o senhor vê a discussão sobre o celibato?

Padre Elias Pavan: O celibato não é uma norma divina. Jesus não obrigou que os padres ou os bispos fossem celibatários. Agora, por uma norma da igreja, e no meu entender, isto é necessário. Até brinco quando algumas pessoas dizem que os padres deveriam se casar. Mas, venham fazer aquilo que eu faço para ver se devia. Ser padre é uma missão que consome bastante de nós. Eu, sinceramente, não me vejo conseguindo administrar uma paróquia, cuidando da vida espiritual de cerca de 20 mil pessoas durante o dia e chegar a noite para lidar com a família. Acho que seria um contratestemunho ter uma família estando ausente da vida da família. E não posso dar mais atenção para a família, deixando de dar atenção para a vida espiritual das pessoas que me foram confiadas. Existem padres casados. Na igreja oriental é uma prática comum e não são todos. Mas, essa é a realidade que vivem e então eles desenvolveram uma forma de conciliar.

 

A igreja está aberta à ordenação de mulheres hoje?

Padre Elias Pavan: Essa decisão é mais bíblica. Jesus escolheu os discípulos homens para exercer o ministério sacerdotal. Houve várias discussões nos últimos anos, algumas por interesse, mas outras por necessidade. Na região Norte, onde há uma escassez muito grande de padres, talvez possa vir a ser uma solução. Eu prefiro concordar com a igreja.

 

Ainda há interesse de jovens em se tornar padres?

Padre Elias Pavan: Quando entrei no seminário, éramos 15. E desses, apenas três foram ordenados padres. Os outros 12 acabaram deixando a caminhada vocacional no meio do caminho. Eu penso que a questão da falta de vocações é um problema da pastoral educacional. Na Diocese de Jundiaí, à qual pertencemos, não tem falta de padres, tendo em vista que temos 69 paróquias e 120 padres. Ou seja, praticamente dois padres por paróquia. Claro que existem casos de padres que estão fora, padres que estão estudando ou em missão, paróquias maiores que necessitam de mais padres, entre outras situações. É uma realidade diferente, por exemplo, da Diocese de Registro, no sul de São Paulo, onde fiz missão, na qual tínhamos 12 paróquias e 18 ou 20 padres. A missão foi muito desafiadora, porque eram paróquias maiores, como a que estava, que tinha 24 comunidades para um padre apenas. Nos últimos tempos houve uma campanha educacional muito grande. Na turma que será ordenada este ano, serão seis padres. No próximo devem ser oito. Então, se a cada ano houver um número desses, é uma conta que parece boa. Fruto de uma caminhada dos últimos anos, já que isso não é algo que se faz de uma hora para a outra.

 

Há quanto tempo existe essa comunidade católica do Santa Cruz?

Padre Elias Pavan: Essa igreja foi construída em 2001, mas a comunidade existe há mais de 30 anos, com celebrações nas casas e, posteriormente, no centro comunitário. Em 2017, eu ainda nem era padre e o bispo (Dom Arnaldo) me mandou para cá, já com a ideia de tentar o desmembramento da paróquia de Nossa Senhora Aparecida e criar uma paróquia nova. Fiquei aqui até 2019 quando fui ordenado padre e acabei sendo transferido para Jundiaí. Outro padre veio para cá e deu continuidade ao trabalho, ainda como pertencente à paróquia de Nossa Senhora Aparecida. Em 2021, voltei e na ocasião o bispo instalou a quase-paróquia, que foi o marco inicial dessa caminhada para criarmos uma paróquia desmembrada.

 

O que muda da classificação de quase-paróquia para paróquia?

Padre Elias Pavan: Uma quase-paróquia é como uma paróquia, mas na qual ainda faltam algumas estruturas, embora já seja independente, com CNPJ próprio, conta bancária própria, jurisdição etc. A quase-paróquia ainda depende de algumas coisas da, digamos, “mãe da paróquia”, mas, felizmente, em 13 de janeiro deste ano foi instalada a paróquia. Digo que quando foi criada a quase-paróquia aqui tínhamos praticamente tudo. A questão financeira foi um problema, porque a quase-paróquia foi criada durante a pandemia, em meio à segunda onda da contaminação. Então, por esse motivo, foi necessário dar esse primeiro passo até se tornar uma paróquia. Não tenho dúvidas de que, se fosse em outro momento, a comunidade poderia ser guiada diretamente para a classificação de paróquia e teria condições de levar adiante.

 

Qual é a importância dessa paróquia para a região?

Padre Elias Pavan: São dois pontos: primeiramente o espiritual e, em seguida, o social. Antes tínhamos um padre para uma paróquia com dez comunidades. Então era uma quantia muito grande de pessoas para um padre só, e isso diminui o número de confissões, celebrações de missas e outras atividades. O fato de criar a paróquia proporciona um cuidado maior com a população na questão espiritual. Assim, também podemos dar mais atenção para as obras sociais. A paróquia atende todo o território que vai do Santa Efigênia até o Laguna. Além dessa matriz, temos mais cinco comunidades, que são capelas esparramadas pelos bairros.

 

Como é desenvolver esse trabalho social nessa região, tida como uma das menos atendidas da cidade?

Padre Elias Pavan: É um desafio muito grande. Temos uma comunhão com o Centro de Referência da Assistência Social, o Cras, e dialogamos com as linhas de ações públicas. De fato, é um bairro, sobretudo o Santa Cruz, que tem uma vulnerabilidade social muito grande. Hoje, diretamente, a maior ação da paróquia é através da Pastoral do Quilo, que oferece cestas básicas para algumas famílias que possuem carências. Mas temos também um trabalho com a Pastoral da Sobriedade para pessoas ou familiares que têm algum tipo de vício, seja ele com drogas ilícitas ou mesmo o álcool. É um desafio, porque é notório encontrar vestígios de drogas nas praças e sabemos dessa situação porque muitas pessoas, sobretudo mães, vêm até aqui falar dos problemas com os filhos. Tentamos dar um apoio espiritual para que essas famílias sejam um apoio na própria casa na vida desses jovens. E, na medida do possível, tentamos atrair esses jovens para nossas atividades. Estando dentro da igreja eles podem se afastar dessas influências que prejudicam a vida.

 

Quais as necessidades da paróquia atualmente?

Padre Elias Pavan: Nosso principal problema hoje, talvez seja a falta de infraestrutura. Temos um salão pequeno e poucas salas. Nem tudo é o que precisaríamos para desenvolver todas as atividades, mas, por estarmos no começo, resolveremos em breve. Financeiramente estamos numa região mais pobre, mas apesar disso, temos um povo muito engajado e que gosta de fazer as coisas. E isso é mais da metade do caminho. Talvez falte, do ponto de vista espiritual, uma consciência maior das pessoas e as vezes falta um pouco de incentivo de outras estruturas. O Poder Público tem se mostrado disposto a apoiar em algumas práticas, seja divulgação e com parcerias. Não queremos dinheiro (público) nem estrutura. O que é nosso é nosso e o que é do Poder Público é do Poder Público. Mas é possível ter esse apoio mútuo sem dúvida alguma.

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