Queda tem origem em vários fatores, mas principalmente no aumento de 44% nas despesas com folha de pagamentos; Prefeitura foi procurada para dar explicações e não se manifestou
Um relatório apresentado pela empresa MetaPública Consultoria e Assessoria em Gestão Pública Ltda, contratada pela Prefeitura de Salto, e juntado ao projeto da Lei Orçamentária Anual, que será votado em breve pela Câmara de Vereadores, apontou que a cidade possui um déficit orçamentário de R$ 95 milhões.
“Os indicadores avaliados apresentaram resultados preocupantes, em decorrência da projeção de resultado orçamentário e financeiro deficitário, sendo assim, orientamos a Prefeitura Municipal a tomar medidas de contenção de despesas para não agravar a situação do fechamento do exercício de 2023”, sugeriu a empresa.
A reportagem do PRIMEIRAFEIRA procurou a Prefeitura logo após a divulgação das informações do relatório na sessão da Câmara de Vereadores na terça-feira (24), mas até o encerramento desta edição o governo municipal não enviou nenhuma manifestação.
Foram levados em consideração para o cálculo do déficit os dados orçamentários contabilizados até o mês de agosto, nos quais se aponta uma redução de receitas de 16,20%. O principal “vilão” foi o aumento de 44% nas despesas municipais, puxadas pelos gastos com a folha de pagamento, que subiram em quase R$ 44 milhões. A continuar nesse ritmo, o valor pode ultrapassar o teto legal de gastos com pessoal de 54% do orçamento.
A consultoria considera que as contas do prefeito Laerte Sonsin Júnior (PL) podem vir a ser reprovadas em razão do déficit pelos órgãos fiscalizatórios, como o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, se nada for feito para conter a situação.
“Em relação às projeções de encerramento do exercício, a expectativa de resultado financeiro e orçamentário deficitário, despesa com pessoal acima do limite legal e não cumprimento do total a ser pago de precatórios em regime ordinário, tende a apresentar cenário de reprovação das contas públicas municipais”, destaca a empresa no documento.
A arrecadação das receitas no período também foi abaixo do empenhado. Até agosto, o montante de receitas foi de R$ 379 milhões, 34% a menos do que o estimado, que era de R$ 505 milhões. A Prefeitura tinha uma expectativa de arrecadar R$ 679 milhões neste ano, mas, de acordo com as projeções, esse valor deve ficar próximo de R$ 540 milhões.
O relatório aponta queda na arrecadação do ICMS de 6,02% no comparativo ao mesmo período de 2022, abaixo inclusive da média do Estado, o que, em valores nominais representa R$ 5 milhões a menos no orçamento. O Imposto Sobre Transmissão de Bens Imóveis, o ITBI, registrou queda de 20%, equivalente a R$ 2,2 milhões a menos; recursos do SUS, queda de 8,25% (R$ 1,1 milhão a menos); e Serviços, 22% (R$ 1,5 milhão a menos). Por outro lado, receitas com o Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores, o IPVA, e Imposto de Renda tiveram aumento na ordem de R$ 5 milhões cada; Imposto Sobre Serviços, o ISS, teve aumento de R$ 3,8 milhões; e Imposto Predial e Territorial Urbano, o IPTU, aumento de R$ 2 milhões.
Há menos de um ano, a secretária de Finanças da Prefeitura, Adriana Lourenço, falou na Câmara que o município havia registrado um superávit líquido de R$ 95 milhões no exercício referente ao ano de 2022. Na época, ela afirmou que o município não estava simplesmente pagando dívidas, mas investindo também. Ou seja, em menos de um ano, a cidade perdeu R$ 180 milhões.
O que acontece hoje é uma irresponsabilidade fiscal e econômica, diz Bertani
O vereador Daniel Bertani (Podemos) fez duras críticas à situação de déficit do orçamento apontado pela empresa de consultoria e afirmou que o aumento de gastos ao longo do ano terá, como consequência, cortes drásticos na Prefeitura.
“O prefeito pode até diminuir pela metade a jornada (de trabalho dos servidores) se o negócio entortar. E vai. E quem vai pagar por essa irresponsabilidade é o saltense em geral. O sinal amarelo será quando os comissionados começarem a ser dispensados. E já, já vai começar”, afirmou. “O que acontece hoje é uma irresponsabilidade fiscal e econômica de receitas e de gastos”, completou.
Antônio Cordeiro (PT) afirmou que trabalhos voluntários já estão sendo prejudicados pelo problema. Ele disse que na Cecap um voluntário foi impedido de utilizar as dependências do ginásio do centro de lazer do bairro por falta de funcionários para abrir o local no período noturno. “Um projeto voluntário da Cecap, com quase 60 alunos, foi fechado, porque não tem funcionários para abrir o ginásio”.
O problema da falta de funcionários decorre de uma decisão do governo de não permitir horas extras. O Executivo publicou um decreto proibindo a realização de horas extras. Quando emergencialmente necessário, os funcionários poderão fazer, mas com o consentimento do chefe do Executivo, que assinará a autorização junto com o secretário da pasta.
Economista avalia que a situação é administrável, mas aponta risco para os próximos anos
O saldo negativo chama a atenção pelos valores, porém, segundo um economista ouvido pelo PRIMEIRAFEIRA a situação orçamentária é passível de ser administrada. O risco, porém, está para os próximos anos, quando começarão a ser deduzidos do orçamento os pagamentos dos empréstimos contraídos pela Prefeitura de Salto nos últimos meses. “Num ponto de vista geral, é uma situação que não é confortável, mas é administrável. Se não houver um cuidado nos próximos dois anos, aí sim se tornará um problema”, disse.
Para o economista, o déficit está sendo gerado por alguns fatores preponderantes, como a redução na arrecadação; fatores econômicos externos; e aumento de despesa. “Talvez a Prefeitura não tenha calculado a redução na arrecadação e a de gastos que foi puxada para baixo”, afirmou.
Em relação ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços, o ICMS, o economista disse que há uma queda no consumo de bens pela população, situação similar à queda de arrecadação com o Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis, o ITBI.
Conforme os dados apresentados, o economista chama a atenção para o aumento de despesas consideradas pontuais, como o aumento da despesa com rescisões. Foram quase R$ 8 milhões na referida despesa em 2023, enquanto no ano anterior, esse valor foi de menos de R$ 1 milhão.
O economista chama a atenção ainda para o pagamento de juros, que teve um aumento de 13%. Em 2023, o Executivo já pagou mais de R$ 1,5 milhão em juros. “O pagamento de juros de contratos tende a aumentar a longo prazo. Assim que encerrar a carência e iniciar a amortização, vão impactar no orçamento”, completou.