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Marcas da Memória – Parte I

O tempo deixa marcas, muitas delas permanentes. Tais marcas, quando deixadas em objetos ou construções arquitetônicas podem ser interpretadas à luz da análise enquanto fonte histórica e revelar aspectos da vida pública ou privada, revelando, em certos casos, modos de vida e afazeres cotidianos.

No âmbito cotidiano, existe aquilo que podemos chamar de “vida prática”, aquela dos afazeres que tomam nosso tempo para além do ofício exercido e/ou estudos. São práticas da manutenção da ordem do lar, da vida doméstica, como lavar roupa, lavar louça, limpar o quintal ou garagem, arrumar filhos para escola, passar roupas, varrer ou passar pano no chão dos cômodos. Enfim, são inúmeros os trabalhos na vida prática doméstica.

Porém, vale uma observação. Se uma casa possui todos esses afazeres, é porque naquele ambiente “o pulso pulsa”, há vida. Sendo assim, marcas do tempo são inevitáveis: rabiscos nas paredes (no caso dos lares com criança) expressando a arte pura manifestada através de dedinhos ingênuos; algum detalhe gasto na pintura; marca de algum objeto que, em um momento de confraternização foi movido de maneira desatenta e lascou um fragmento da parede; uma porta de armário esperando um alinhamento, tendo em vista, a movimentação constante de pessoas que vivem o lar; um piso levemente trincado após a queda de um objeto durante guerra de travesseiros; vida acontecendo…

Há a possibilidade da ressignificação de espaços, ainda que a arquitetura seja mantida ou ao menos alterada em alguns pontos, o mesmo espaço pode não ter mais (temporariamente ou não) a mesma função. É possível, por exemplo, que uma casa se torne escritório de trabalho se disponibilizada para tal finalidade.

Tenho uma boa memória de uma escola que lecionei em Salto, em que todo mês de outubro a direção organizava um belo jantar para comemorar o Dia dos Professores e o Dia do Funcionário Público. Os pratos eram servidos no espaço que cotidianamente serve como biblioteca da escola, mas que durante a noite do jantar tomava outra função simbólica, continuava sendo um espaço de convivência, porém adaptado e transformado em uma bela área de confraternização. Enfim, o espaço era o mesmo, mudava temporariamente sua função.

Esse texto é uma breve introdução de uma prosa que teremos ao longo dos próximos “Dedinhos de Prosa” aqui no PRIMEIRAFEIRA. A reflexão é inspirada em uma marca encontrada no piso de madeira do atual prédio em que trabalho, um antigo casarão do começo do século XX que hoje abriga como função as dependências da Secretaria Municipal de Cultura, Turismo e Patrimônio Histórico de Cabreúva.

No próximo texto conversaremos mais!

Um bom fim de semana a todos.

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