O volume de chuva e as enchentes registradas no Rio Grande do Sul não são apenas catástrofes climáticas isoladas. Elas são resultado das mudanças climáticas globais e também falta de ações governamentais ao longo de anos. Mais do que isso: elas devem se tornar uma tendência não apenas no Sul do Brasil, mas em várias partes do mundo. As observações são do climatologista Rodolfo Bonafim, ouvido pelo PRIMEIRAFEIRA.
“Não é só o efeito do aquecimento global. É também o efeito de um clima regional de descaso governamental. Nessa região dos pampas há uma tendência para a pecuária, mas acontece que houve uma mudança para a agricultura, sobretudo com o plantio de soja. E quando há uma monocultura, você esgota o solo e causa impacto no regime de chuvas. É algo como tem acontecido no Mato Grosso, com o cerrado virando caatinga”, explicou.
Segundo Bonafim, as chuvas volumosas na região ocorreram por conta de um bloqueio atmosférico natural da transição entre as estações, agravados pelo efeito do fenômeno El Niño, numa proporção descomunal. E situações como essa devem se tornar cada vez mais frequentes. “A tendência que vemos é que as ondas de calor, chuvas extremas e longos períodos de estiagem se tornem cada vez mais frequentes. Embora não sejam novidades, elas estão ocorrendo com mais frequência e acumuladas em um curto espaço de tempo”.
O Rio Grande do Sul, aliás, está mais suscetível às mudanças climáticas, conforme estudos realizados há quase duas décadas, informou Rodolfo. “Um artigo de 20 anos atrás de dois geólogos da Universidade de São Paulo, especializados em paleoclimatologia, que é o clima das eras passadas, deduziu que o Sul do Brasil, Noroeste da Argentina e o Chaco paraguaio seriam as primeiras regiões atingidas pelo aquecimento global. E é o que está acontecendo. Não apenas por essa situação das chuvas, mas de uns anos para cá, vimos verões extremamente quentes no Rio Grande do Sul e na Argentina”.
Por fim, o climatologista lembrou de casos ocorridos no Estado de São Paulo para alertar sobre o impacto das mudanças climáticas em todo o Brasil. “Em 2020 a região de Santos e Guarujá foi bastante afetada com deslizamentos de terra, que, aliás, não foi um deslizamento comum. Foi um escorregamento de massa que rolou morro abaixo. E ano passado, o litoral norte de São Paulo foi bastante afetado. Bertioga teve o maior volume de chuva da história do Brasil em um curto período de tempo. Infelizmente, tragédias como essas do Rio Grande do Sul são anunciadas”, completou.