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Especialista em Direito afirma que jovens ainda não estão preparados para a eleição

Alexandre Soares Ferreira, coordenador do curso de Direito do Ceunsp, acha que deve haver mais conhecimento e formação

 

O professor coordenador do curso de Direito do Centro Universitário Nossa Senhora do Patrocínio (Ceunsp), Alexandre Soares Ferreira, afirma que o jovem ainda não está preparado para o processo eleitoral, seja como eleitor, seja como candidato.

Para ele, falta ainda um interesse maior para buscar os conhecimentos específicos e formação para entender o processo como um todo, que é, por si só, bastante complexo, sobretudo no Brasil, que é um país com dimensões continentais.

Dessa forma, saber o que pensa e como vai se comportar o jovem nas próximas eleições ainda é uma incógnita. Mesmo assim, o professor entende que é um processo sem volta a participação jovem. A presença maior na última eleição se repetirá, segundo ele.

Na entrevista que concedeu ao PRIMEIRAFEIRA, Alexandre Soares Ferreira tenta traçar um perfil ideal para que o jovem se adapte melhor ao processo eleitoral e ainda uma forma de enfrentar a falta de experiência e de conhecimento nessa área.

 

Os jovens ajudaram a decidir as últimas eleições, sobretudo municipais, e a participação deles é crescente. Como o senhor vê esse quadro no processo eleitoral como um todo?

Alexandre Soares Ferreira: Eu acho interessante essa participação. A juventude hoje está mais inserida no contexto político. Ela tem mais interesse pela situação do país. Até aqueles que não têm obrigação de votar fazem questão de tirar o título eleitoral. Talvez a facilidade na comunicação tenha ajudado o jovem a se inteirar nesse cenário e, com certeza, é um público que está definindo o resultado das eleições.

 

O senhor acha que essa tendência se perpetuará nas próximas eleições em todos os níveis de governo?

Alexandre Soares Ferreira: Imagino que sim. Essa é uma tendência que só deve crescer. O jovem, cada vez mais, estará mais inserido no cenário político.

 

O radicalismo político que vimos nas últimas eleições para presidente interfere de alguma forma nos jovens para o futuro?

Alexandre Soares Ferreira: É uma situação muito triste. Como professor, nesse período conversei muito com meus alunos. Não sobre posicionamento político, mas sobre a questão de defender a democracia independentemente do lado. Democracia quer dizer que você está de um lado e eu do outro e podemos conversar e discutir tranquilamente. Mas, infelizmente, noventa por cento da população esqueceu disso. Ou você pensa como eu ou você não serve para nada. É uma tendência que deve perdurar pelos próximos anos, e talvez até piore. Isso é um mal trazido pelas redes sociais que ajudam a disseminar essa situação.

 

As redes sociais também ajudaram a propagar fake news. Não há como controlar essa situação?

Alexandre Soares Ferreira: Temos uma necessidade disso. O Direito está muito atrasado nesse meio. Estamos há um bom tempo sem regulações. A quantidade de crimes no meio digital é enorme e praticamente sem punição alguma. Uma pessoa posta qualquer coisa que pode causar danos terríveis a outra e não há punição alguma. Existem algumas legislações na questão digital, mas ainda é muito pouco. Um crime de rede social é respondido como um crime presencial, porém, o que o legislador deve ver é o impacto disso. Uma coisa é xingar alguém pessoalmente, outra coisa é fazer isso na presença de milhões de pessoas, que é algo que a internet permite. Então, o dano é muito maior. O legislador deve avaliar o crime e o dano não só na vítima como da sociedade.

 

Como conscientizar a população, principalmente os mais jovens, em relação à escolha dos candidatos certos?

Alexandre Soares Ferreira: O grande problema do nosso país é a educação. Temos um sistema de ensino falido. Há alunos que chegam formados do ensino médio que mal sabem escrever. A escola é importante nessa educação política. Antigamente tinha-se aula de política nas escolas. Hoje não tem mais. O brasileiro acaba não tendo essa noção de democracia, não sabe como é um sistema eleitoral, qual a função. Sempre faço uma brincadeira com as pessoas que falam que votaram em fulano. Eu pergunto o porquê. A maioria não sabe responder. Votam porque acham legal, acham o cara bonito ou porque um amigo falou.

 

Essa educação política levaria quanto tempo?

Alexandre Soares Ferreira: Falamos de um processo de décadas. Ainda que alguém tome uma atitude hoje, os efeitos disso só serão vistos daqui a quinze, vinte anos.

 

Aplicar esse ensino sobre política nas escolas é factível?

Alexandre Soares Ferreira: É, sobretudo, necessário. Na minha época havia uma disciplina chamada de Educação Moral e Cívica, em que aprendíamos sobre cidadania e processo eleitoral. A escola não deve adentrar no viés político, mas poderia voltar a ser inserido. Talvez isso tenha deixado de ser aplicado por falta de interesse dos políticos que passaram por nosso país, afinal, uma população com consciência política vai cobrar mais dos políticos.

 

A participação jovem também se processa como candidato a cargos eletivos. Como o senhor vê essas candidaturas?

Alexandre Soares Ferreira: Essa participação do jovem também como candidato, como político, é positiva, mas desde que esteja preparado para isso. O que estamos vendo é que não apenas os jovens, mas a maioria não está preparada para exercer o cargo. O eleitor se identifica com o político que tem uma faixa etária próxima da dele, mas em última análise é preciso escolher um político que esteja preparado para o cargo.

 

É mais preocupante o político jovem chegar em um ambiente político sem os conhecimentos adequados por ser jovem?

Alexandre Soares Ferreira: É muito preocupante. Até porque o político é quem faz as leis, por isso é importante que quem esteja lá, esteja preparado para isso. No Brasil, infelizmente há muitas leis malfeitas, leis que se contradizem, justamente pela falta de preparo.

 

Como deveria ser o preparo adequado para o jovem que quer ingressar na política?

Alexandre Soares Ferreira: Eu, particularmente, penso que deveria haver um critério de educação para poder ser político. Talvez, num ponto de vista geral, possa agredir o estado democrático de direito, afinal todos temos o direito de votar e ser votado, mas colocar no topo do poder quem, às vezes, não sabe como fazer ou do que se trata uma lei, é um pouco arriscado.

 

Diante dessa necessidade, o senhor acha que é possível que venha a existir uma obrigação de determinado nível de escolaridade para o cidadão se tornar um político?

Alexandre Soares Ferreira: Na verdade, acho que não, justamente por causa da Constituição. Ela não pode ser mudada, só se houvesse um novo golpe, como já houve. A Constituição permite ao analfabeto e àquele que não tem muita ou nenhuma cultura possa ser político, mas isso acaba causando fatos como o de termos políticos sem preparo.

 

O senhor acha que influenciadores digitais podem ser alavancados numa carreira política pelo público que os acompanham?

Alexandre Soares Ferreira: Sim. É como acontecia antigamente com a TV, que era o meio em que as pessoas mais eram expostas. Hoje em dia as mídias sociais, Youtube, Tik Tok, acabam tendo um alcance maior para o público jovem, que passa a admirar essas pessoas e as vezes votando até por motivos errados. Essa é uma tendência do ser humano, chamada de mimetismo, que você admira e quer imitar quem vemos na televisão e nos meios digitais.

 

Qual a influência, sobretudo de alguns políticos que tem atitudes não condizentes com o cargo ocupado, para os políticos jovens?

Alexandre Soares Ferreira: Eu sempre digo para meus alunos: quando eles virarem advogados, a partir dali eles não serão mais um indivíduo. Eles representarão uma classe. O político tem de ter um comportamento exemplar, mais do que qualquer outra pessoa, afinal ele está representando o povo e muitas outras pessoas se pautam, se inspiram nele. Então, é necessário ter certa responsabilidade social.

 

Qual o conselho o senhor daria para o jovem que quer ingressar na política chegar lá sem decepcionar?

Alexandre Soares Ferreira: Estudar. Estudar sociedade, estudar política, estudar Direito e conhecer o sistema que ele quer seguir. É preciso ainda conhecer bem o município, as pessoas, as dificuldades. Não basta apenas morar, é preciso saber as necessidades, até porque é preciso ter compromisso. O político tem de ser exemplo de comportamento, de respeito e de honestidade. Teve até um caso de uma vez que estava indo para São Paulo e vi jogarem de um carro do Poder Legislativo de alguma cidade uma latinha pela janela. É muito mais feio uma ação como essa de político do que de um cidadão que não tem compromisso em representar a sociedade.

 

Pela inexperiência, os jovens que ingressam na política acabam podendo se corromper mais facilmente?

Alexandre Soares Ferreira: É preciso ter uma personalidade formada para não acabar se corrompendo, afinal ele está dentro de um ambiente que pode contaminar.

 

Qual a influência o senhor vê que o conflito de gerações pode causar em uma Câmara ou em um Senado?

Alexandre Soares Ferreira: É saudável e gera até um certo controle. Os mais velhos podem dar uma segurada nos mais novos e os mais novos podem tentar mudar a mentalidade dos mais velhos. É uma diversidade que é saudável na política.

 

Como o senhor vê o sistema eleitoral brasileiro na comparação com o de outros países?

Alexandre Soares Ferreira: Temos um sistema que funciona e foi desenhado para que o povo seja bem representado nas esferas municipal, estadual e federal. No papel, é um sistema que funciona. Os Estados Unidos, por exemplo, não podem servir de comparação, até porque a legislação muda de Estado para Estado, enquanto aqui a mesma lei que vale em Salto, vale no Rio Grande do Norte. Porém, um país do tamanho do Brasil acaba criando certas situações que privilegiam algumas regiões.

 

Na avaliação do senhor, o político formado em Direito teria mais facilidade para se adaptar ao processo eleitoral?

Alexandre Soares Ferreira: Creio que sim, pois conhece o sistema e a legislação. Então, teria uma facilidade. Porém, qualquer formação acadêmica colaboraria. Para a política, talvez a formação nas áreas humanas e sociais facilite um pouco, mas, mesmo aqueles formados em exatas, possuem uma cultura elevada que certamente lhe ajudará.

 

O que um político jovem precisa fazer para se manter no meio?

Alexandre Soares Ferreira: Precisa de equipe. A maioria dos cargos políticos permite a formação de uma assessoria social, para tratar de algumas questões específicas; assessoria jurídica, já que a maioria deles não é formada em Direito; e assessoria parlamentar, para conseguir implantar suas ideias e conseguir apresentar projetos de leis e decretos. É isso.

 

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