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‘Estamos formando pessoas de caráter e não só atletas’, diz professor do taekwondo campeão de Salto

O taekwondo vem crescendo cada vez mais em Salto, o que fez com que a cidade passasse a ser reconhecida e respeitada pelo seu desempenho na modalidade em todo o país. Para se ter uma ideia dessa mudança de conceito, nos últimos Jogos Regionais, Salto foi a campeã geral no masculino e no feminino, além de os atletas comandados pelo mestre Antônio Marcos terem trazido medalhas individuais.
O mestre Antônio Marcos, professor de taekwondo da Prefeitura de Salto, concedeu entrevista ao PRIMEIRAFEIRA nesta semana para falar sobre o projeto que desenvolve e que vem servindo de base para o bom desempenho. Para ele, a importância do esporte para transformar vidas foi coroada com os bons resultados alcançados pela cidade nos Jogos Regionais.
“Quando vamos para uma competição e saímos com um bom resultado é uma coroação, pois vemos que o trabalho que estamos fazendo está dando resultado”, disse ele, enaltecendo o apoio da Prefeitura e o incentivo que recebe dos pais dos atletas, alguns que acabam também treinando junto e fazendo do esporte uma ponte para unir mais ainda pais e filhos em torno do mesmo objetivo.
Confira abaixo a entrevista na íntegra:

Desde quando o senhor dá aulas de taekwondo na Prefeitura?
Mestre Antônio Marcos:
Faz cerca de sete anos que dou aulas de taekwondo pela Prefeitura de Salto. Também tenho meu espaço, onde dou aulas particulares e, antes de termos essa parceria com a Prefeitura, fiquei por cerca de dois anos com um projeto na minha academia, oferecendo aulas gratuitas aos sábados. Depois que fechamos a parceria com a Prefeitura, as aulas são oferecidas no Buracão (Centro Esportivo João Luiz Guarda), no Santa Efigênia e na Escola Costela. Mas como a quadra da escola está em reforma, por enquanto as aulas estão sendo realizadas no Cras. Ao todo, somos quatro professores. Além de mim, tem a minha esposa Lucimara dos Santos Maciel, nossa filha Nicole Maciel Marcos e o professor Rodrigo da Silva Gomes de Camargo.

Qual a importância desses projetos oferecidos pela Prefeitura?
Mestre Antônio Marcos:
A importância para nós é vermos Salto sempre na mídia. Hoje em dia Salto é reconhecida no taekwondo. Lembro a primeira competição que nós fomos em Maringá (PR), acho que em 2014 ou 2015, e perguntaram de onde éramos. Quando falávamos que éramos de Salto, as pessoas respondiam que nunca tinham ouvido falar. Ninguém conhecia Salto. Hoje, em qualquer lugar que você chegar e falar que é atleta de Salto, as pessoas te respeitam, porque sabem que entramos fortes nas competições. Sempre falo para os atletas que o importante não é vencer e sim o que ele desenvolve na luta. Ganhar ou perder faz parte, do mesmo jeito que nossos atletas treinam, do outro lado também treinam. O resultado é consequência do trabalho.

Quantos alunos a equipe que o senhor comanda atende pela Prefeitura atualmente?
Mestre Antônio Marcos:
Cerca de 60 alunos e temos desde crianças a partir dos seis anos até adultos, pois alguns pais vão levar seus filhos para as aulas, pedem para treinar junto e acabamos deixando, pois acho que o esporte é isso, uma integração. Hoje em dia as pessoas trabalham tanto e têm tanta preocupação, então as aulas são um horário em que os pais podem interagir com seus filhos também, o que é muito bom.

Tem aulas todos os dias?
Mestre Antônio Marcos:
No Buracão, temos aulas de terça e quinta-feira, das 21h às 22h, e aos sábados, das 14h às 16h; no Santa Efigênia, as aulas são de terça e quinta-feira, das 19h30 às 20h30; e na Escola Costela, as aulas são às sextas-feiras, das 8h às 10h, e a tarde, das 14h às 16h.

As inscrições podem ser feitas a qualquer momento?
Mestre Antônio Marcos:
Sim, as inscrições podem ser feitas a qualquer momento e são realizadas presencialmente na Secretaria de Esportes e Lazer da Prefeitura. Mas algumas crianças vão até o local sem realizar inscrições e fazem as aulas, pois não vou negar dar aula para uma criança.

Qual a importância do projeto na vida do senhor?
Mestre Antônio Marcos:
O projeto agregou muito na minha vida. Sempre trabalhei com pessoas. Eu não digo que ajudamos pessoas, pois tudo que fazemos reverte para nós mesmos. Tive uma infância meio difícil e costumo dizer que minha índole não era boa. Eu era um moleque que arrumava confusão em todos os lugares e o esporte me mudou bastante. Acredito que tudo que fazemos é para o nosso próprio crescimento como pessoa.

Os atletas que conquistaram medalhas nos Jogos Regionais são da Prefeitura ou particulares?
Mestre Antônio Marcos:
Os atletas que disputaram os Jogos Regionais são alunos da minha academia particular, até porque nessa competição os atletas precisam ter ao menos 16 anos para participar e nos projetos da Prefeitura a maioria é de crianças. Somente uma aluna do projeto participou da competição, pois era a única que tinha idade para participar. Mas a Prefeitura nos ajuda nessas competições regionais oferecendo transporte, hospedagem e alimentação para todos os atletas.

Como os resultados alcançados nos Jogos Regionais são absorvidos pela equipe e pelos atletas?
Mestre Antônio Marcos:
Para nós é uma coroação. Quando vamos para uma competição e saímos com um bom resultado é uma coroação, pois vemos que o trabalho que estamos fazendo está dando resultados. Realmente o nosso trabalho tem resultados e não só nos Regionais, pois temos atletas da Seleção Brasileira, atletas que já disputaram fora do país, como na Coréia, Bulgária e Costa Rica. Sempre procuro falar para os atletas que o mais importante não é medalhar e sim formar pessoas com caráter e que tenham capacidade de atuar na sociedade, dando o melhor delas e ajudando outras pessoas. Busco formar pessoas que consigam caminhar sem depender dos outros e sem pisar em ninguém também.

Os Jogos Regionais são a competição mais difícil para os atletas?
Mestre Antônio Marcos:
Não é que seja o campeonato mais difícil, mas é um campeonato que não tem separação de idade e nem de categoria. A separação é por peso. Antigamente podiam se inscrever atletas da faixa azul até a faixa preta e eles poderiam se enfrentar por conta do peso. Hoje em dia existem duas categorias: Elite e Talento. As faixas coloridas só lutam entre si e os faixas preta também. Mas, ainda assim, tem chance de um atleta faixa preta que luta há anos e tem 35 anos enfrentar um de 18 anos, que tem a faixa há pouco tempo, por exemplo. Então é diferente do Campeonato Paulista, por exemplo, onde existem as categorias e os atletas são separados por peso e idade.

Qual será o próximo campeonato que a equipe disputará?
Mestre Antônio Marcos:
Vamos no próximo mês para o Campeonato Brasileiro em Fortaleza (CE). A classificação veio através das Etapas Paulistas. São três etapas e somente os dois primeiros colocados de cada categoria se classificam para o Brasileiro. São mais de 80 cidades que participam. Para se ter uma ideia, na última etapa tinha mais de 800 atletas. Temos seis atletas classificados, mas só cinco vão para a competição. Porque o Campeonato Brasileiro agora em Fortaleza é somente luta, o Poomsae vai ser em setembro, em São Paulo, e essa atleta classificou para os dois, mas o pai achou melhor ela disputar somente o Poomsae por ser aqui. Porque nessas viagens os próprios pais precisam bancar tudo e é caro. A única coisa que a federação pagou foram as inscrições. Mas transporte, hotel e alimentação, o atleta precisa bancar com recursos próprios.

Como definir o legado do esporte?
Mestre Antônio Marcos:
A importância do esporte é a transformação que ele faz na vida das pessoas, pois a medalha passa. São fases. O mais importante é a vida lá fora e o atleta ser lá fora também uma pessoa boa e que se preocupa com os outros. Tem alguns alunos que vêm para o projeto por indicação de professores da escola para ajudar no comportamento e disciplina e eles percebem a diferença nesses alunos.

Tem alguma história de aluno que chamou mais a atenção do senhor?
Mestre Antônio Marcos:
Temos um aluno que hoje está com 12 anos, mas está conosco desde os sete. Ele tem autismo e, quando começou as aulas, o autismo era em um grau bem severo. Ele não gostava de ficar perto de ninguém, se assustava com o barulho, até para conversar com ele no início era difícil. Mas os pais sempre incentivaram e ajudaram para que ele permanecesse nas aulas e lembro que no primeiro exame dele não teve uma pessoa sequer que não chorou. Então é algo muito gratificante. Dentro do limite e da capacidade dele, ele faz tudo. A luta melhorou muito a convivência e a coordenação dele. Ele é muito engajado com as crianças, brinca e conversa. Então é muito gratificante ver ele feliz desse jeito. Temos outros alunos com autismo também, além de uma aluna que faz aulas conosco no Buracão que tem síndrome de down. Ela tem seis anos e é uma criança espetacular. O comportamento dessas crianças é diferente, mas vamos adequando para que essas diferenças diminuam, pois não posso manter essa diferença. E é isso que o esporte faz. Socializamos essas crianças da mesma forma. Tanto que, se eles erram, eu corrijo da mesma forma e com isso a própria criança se sente agregada e mais acolhida. O objetivo é integrar essas crianças. Tenho muito mais satisfação e gratidão em treinar com as crianças nos projetos do que dar aulas para alunos já formados, pode ter certeza disso.

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