Paciência e disciplina são essenciais para um bom planejamento financeiro, diz especialista

Marcos Mizuki, formado em educação financeira, fala sobre a importância de poupar e de saber direcionar o dinheiro

Planejamento financeiro não é tratar apenas de dinheiro, mas sim de comportamento. Uma relação difícil para a maioria dos brasileiros. Uma pesquisa do instituto Datafolha, em 2023, mostrou que mais da metade dos brasileiros pensa em planejar suas finanças, porém, a grande maioria tem dificuldade em fazer. De fato, é preciso saber que se planejar financeiramente é algo que demanda, sobretudo, tempo, como explicou o educador e planejador financeiro Marcos Mizuki ao PRIMEIRAFEIRA.
“Em dados momentos eu chego a pensar em como levar a educação financeira para quem ganha, por exemplo, R$ 2 mil. Porém, quando pego a fotografia financeira da pessoa, encontro gastos que podem ser considerados dispensáveis e, se a pessoa fizer uma forcinha, dentro de alguns anos, o jogo dela vai virar. Porém, é preciso ter paciência”, afirmou.
Na entrevista ao jornal, Mizuki falou da importância em planejar as finanças a curto, médio e longo prazos para conquistar os projetos de vida e para ter uma aposentadoria tranquila. “Quem acumula dívidas, na terceira fase da vida dependerá da ajuda de outras pessoas, pois as aposentadorias são medíocres. Hoje, 80% da aposentadoria da maioria das pessoas é utilizada para gastos com remédios, muito em função da falta de planejamento. Para qualquer coisa que for realizar na vida é preciso um planejamento, de curto, médio e longo prazos. Não tem por onde fugir”, disse.
Confira a entrevista completa abaixo:

O que é educação financeira e como aplicá-la na vida?
Marcos Mizuki:
A educação financeira nada mais é do que a forma como você lida com o dinheiro e quais as possibilidades que ele pode te proporcionar. Só que, por trás de tudo isso, tem uma estratégia e um planejamento de vida. Existem três fases da vida, sendo a primeira na qual, até uns 25 anos, dependemos dos pais; a segunda e primordial, que varia dos 25 aos 65 anos, que é a fase produtiva, na qual temos de acumular recursos e patrimônios; e a terceira, que é a fase da aposentadoria, onde você tentará manter o padrão de vida que tinha nessa segunda fase. Porém, nessa segunda fase hoje em dia, ao invés de recursos, as pessoas estão acumulando dívidas. Estão adquirindo bens que lá na frente não trarão benefícios. Quem acumula dívidas, na terceira fase da vida dependerá da ajuda de outras pessoas, pois as aposentadorias são medíocres. Hoje, 80% da aposentadoria da maioria das pessoas é utilizada para gastos com remédios, muito em função da falta de planejamento. Para qualquer coisa que for realizar na vida é preciso um planejamento, de curto, médio e longo prazos. Não tem por onde fugir disso se falando em educação financeira.

Então educação financeira envolve, além dos números, o comportamento e o estilo de vida da pessoa?
Marcos Mizuki:
Quando falamos de educação financeira, o comportamento tem de vir antes para que os números sejam positivos. Se eu só gasto, os números não serão bons. Agora, se eu consigo poupar pelo menos cinco ou dez por cento da minha receita, os números já começam a jogar a nosso favor. Os números são apenas uma consequência do planejamento. Conheço pessoas que ganham um salário-mínimo, viajam todo ano e têm sua casa, simples, mas dentro da realidade da pessoa. Por outro lado, pessoas que ganham seis mil ou sete mil por mês, estão endividadas, porque tentam levar uma vida fora da sua realidade. É comum você ver pessoas gastando R$ 100 ou R$ 150 toda semana com um kit churrasco em vez de investir esse dinheiro. Não estou dizendo que está errado fazer isso, mas não dá para se divertir os quatro finais de semana do mês. São quase R$ 1000 por mês só com isso. Mas, essa é uma questão cultural. Por isso, o trabalho da educação financeira é árduo para convencer a planejar.

Qualquer pessoa, com qualquer tipo de renda, pode ter um planejamento financeiro e se beneficiar dele?
Marcos Mizuki:
Em dados momentos eu chego a pensar em como levar a educação financeira para quem ganha, por exemplo, R$ 2 mil. Porém, quando pego a fotografia financeira da pessoa, encontro gastos que podem ser considerados dispensáveis e, se a pessoa fizer uma forcinha, dentro de alguns anos, o jogo dela vai virar. Porém, é preciso ter paciência. A questão é que, mesmo que a pessoa ganhe R$ 2 mil, R$ 4 mil ou R$ 6 mil, ou o que for. Quem não cuida de R$ 10, não cuida de R$ 1 milhão.

Quais os principais erros que as pessoas cometem que as impossibilitam de se planejarem financeiramente?
Marcos Mizuki:
A ganância é o principal. A ganância faz com que tenhamos esse imediatismo. É possível ser ganancioso para ter um bem, traçar uma metodologia e seguir. Agora, a ganância de fazer o que for preciso para alcançar é algo ruim. Além disso, o ego também atrapalha. Se você não conseguir dominar seu ego, ele te afunda. Os mais jovens ainda têm um tempo de maturidade em que é possível cair e se levantar, mas para algumas pessoas, o tempo acaba ficando mais curto pela idade em que estão.

Quem nunca se planejou, ainda é possível começar a pensar nisso e obter algum resultado positivo?
Marcos Mizuki:
Para se planejar nunca é tarde. Agora para realizar alguns sonhos, talvez. Uma pessoa com 60 anos que quer ficar milionária com investimentos, ela tem essa possibilidade, mas eu não me arrisco a dizer que será fácil. É preciso se adequar à realidade de cada pessoa e perseverar.

Qual o impacto das redes sociais no planejamento financeiro?
Marcos Mizuki
: Hoje a rede social fica te bombardeando com anúncios e propagandas. Fica te estimulando a necessidade de que sempre estamos precisando de alguma coisa. Mas será que estamos precisando mesmo? Eu fiz uma palestra no Empreenda Salto com muitos jovens que pensam em criptomoedas, porque o perfil de pessoas que eles veem nas redes sociais é de jovens milionários que estão fazendo algo que os está deixando ricos. E eles querem repetir isso. O problema é não deixar o tempo agir. Eles querem para ontem. Dessa forma, o pouco recurso que a pessoa possa ter, acaba sendo perdido, porque ele não sabe o processo. Ele quer cortar o caminho, atropelando o que tiver pela frente e isto não funciona em educação financeira.

O brasileiro tem dificuldade em se planejar financeiramente?
Marcos Mizuki:
Quando estourou a pandemia, muitos brasileiros não tinham sequer dois meses de reserva financeira. Todos achavam que, no pós-pandemia, a população criaria uma reserva financeira, só que o auge da pandemia passou e as pessoas continuaram a gastar sem pensar. É preciso ter em mente que as emergências vão acontecer, só não sabemos quando. E quando acontecem, o que mais vemos é o uso do cartão de crédito. Ele se torna uma extensão do pagamento e não uma ferramenta. A pessoa tem o pensamento do “depois eu me viro”. Só que isso não vai acontecer, porque no mês seguinte, salvo raras exceções, o salário será o mesmo. Isso faz com que a pessoa vá se enrolando sem perceber e acabe enforcada sozinha.

Guardar dinheiro na poupança é um investimento?
Marcos Mizuki:
Tenho alguns mentorados que sempre usaram a caderneta de poupança como principal investimento. A maioria nem sabe como funciona a poupança e essa pessoa também não está interessada em saber. Ela quer guardar o dinheiro dela. Há quem diga que caderneta de poupança não é investimento e, durante muito tempo, eu também pensava dessa maneira. Mas, com o tempo, você amadurece e enxerga a vida das pessoas. Como vou falar para uma pessoa de 60 ou 65 anos, que vive com o rendimento da caderneta de poupança, na qual investe há 30 anos e com a qual conquistou seus bens, que ela não é boa? A caderneta não é o problema e sim o hábito de poupar que vai trazer os frutos. Para essas pessoas que utilizam apenas a poupança, pouco importa o rendimento. O que ele quer ver é que os R$ 100 que ela colocou hoje, mês que vem viraram R$ 105. Então, não tenho como dizer que poupança não seja um investimento.

Hoje você ajuda muitas pessoas a se planejarem financeiramente, mas você já sofreu bastante sem planejamento?
Marcos Mizuki:
Em 1991, com meus 19 anos, eu decidi ir para o Japão em busca da minha independência financeira, mesmo sem saber ao certo o que era. O que eu sabia era que o dinheiro poderia me proporcionar. Fui para ficar dois anos, mas acabei ficando 17 anos. Meus projetos foram mudando, mas minha independência financeira continuou sendo o foco principal. Os primeiros anos foram bastante complicados. Sofri descriminação, trabalhava 15, 16 horas por dia, não tinha férias como temos aqui no Brasil. Mas tudo estava dentro de um propósito. Em 2008, eu retornei para o Brasil e sofri um choque cultural. Com quatro meses aqui, num domingo pela manhã, estava eu e minha esposa em casa, quando entraram três assaltantes armados e levaram boa parte da minha independência financeira, uma vez que, naquela época, não tinha a facilidade que temos hoje de contas em bancos digitais. Mesmo assim, decidi ficar no Brasil e empreender. Foram dez anos de prosperidade. Só que a falta de conhecimento das leis brasileiras me fez enfrentar o primeiro processo trabalhista. Foram várias situações que, por falta de conhecimento, me fizeram perder o controle. Em dois anos eu quebrei. Fui à falência. Voltei para o Japão em 2019 para ficar um ano e conseguir pagar minhas contas, porém, estourou a pandemia e retornei para cá em 2022. Nesse período eu estudei, fiz pós-graduação em psicologia e entendi que o aconteceu comigo foi falta de conhecimento. Foi então que conheci a educação financeira e as coisas clarearam para mim.

Como você se tornou um consultor financeiro?
Marcos Mizuki:
Fiz treinamentos e cursos de educador financeiro ainda quando estava no Japão e comecei a me conectar com pessoas daqui. O fato de estar no Japão fazia com que as pessoas me olhassem de outra forma, embora não fosse ninguém especial. Eu era apenas um curioso. Mas, estar lá me abriu portas e me aprofundei com conhecimentos valiosos. Foi então que eu decidi que era isso o que queria para minha vida. Eu quero ajudar as pessoas que estão passando pela situação da qual estou saindo, porque situações como essa acabam com vidas e casamentos. Quando retornei ao Brasil, já sabia aonde iria pelos meus contatos e hoje faço parte da Associação de Profissionais Orientadores e Educadores em Finanças. Eu era representante deles no Japão. E atuo na Solution For Life, primeira franquia de planejamento financeiro do Brasil, que conta com um escritório em Indaiatuba.