Cidades

Interligadas

Quantos tempos cabem no tempo?

Engraçado, quando eu vou pra longe, muito longe da minha vida que de perto parece tão grande, tão importante, tão agitada, tão afobada… quando chego lá é um suspiro. Tenho tempo para respirar. E para expirar também. Nossa. Solto o ar e toda a pressa que carrego comigo, sem perceber. E nessa cidadezinha longínqua, onde meu pai nasceu, o tempo para. Ele para a fim de saborear um sorvete, ele para quando caminho pelas ruas. Ruas nas quais as pessoas olham nos olhos, dão tantos bons dias quanto Machado de Assis, falam de coisas sem sentido, mas que fazem sentir.

Agora, aqui, as coisas sem sentido são substituídas por coisas que fazem sentido demais (vulgo estímulo), mas que pouco fazem sentir. Acho que o tempo passava diferente, parece que antes dava tempo de existir. Não sou desse tempo de antes, só sinto o gostinho dele às vezes (gosto de sorvete e de bom dia). Já nasci em tempo mudado, na correria. Cesárea. Hoje em dia não tem tempo nem pra nascer. Colocam-te num mundo que gira rápido demais. Atordoante. Nessa rotação toda a vista embaça, perde-se a consciência.

Assim, vive-se a anestesia do cotidiano, de acordo com Larrosa Bondía, doutor em pedagogia, uma destruição generalizada da experiência; em suas palavras “A experiência é o que nos passa, o que nos acontece, o que nos toca. Não o que se passa, não o que acontece, ou o que toca. A cada dia se passam muitas coisas, porém, ao mesmo tempo, quase nada nos acontece. Dir-se-ia que tudo o que se passa está organizado para que nada nos aconteça”. De novo – para isso realmente te acontecer – “tudo o que se passa está organizado para que nada nos aconteça”.

No fim eu volto à rotina e o tempo volta a passar, correr, voar, à moda maquinária, industrial e capitalista do século 21, tão rápido que não vejo. E as pessoas ao meu redor também. Ninguém se vê, ninguém vê o mundo. Cada um está no seu próprio mundo e são tantos mundos de uma só vez. Somos bombardeados diariamente com informação atrás de informação, de maneira quantitativa, porém nada qualitativa. Falta tempo para digerir tanta informação.

Talvez isso tudo seja confuso. Peço perdão, é que vivo eu também no meu próprio mundo e são outros tantos mundos dentro de mim. Talvez entenderia melhor se tivesse tempo para ler de novo, mas não perca tempo, sei que anda tudo corrido demais.

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